Economista do Dieese afirma que renda média do brasileiro, estagnada há uma década, depende de uma política industrial robusta para o país

Escrito por: Carolina Servio, CUT Brasil

A CUT promove esta semana debate com dirigentes sobre o Macrossetor da Indústria. Na segunda, 22, o governo federal lançou o programa Nova Indústria Brasil, que repensa o fomento ao setor. Agora, a central discute quais as disputas é preciso travar com a sociedade e com o governo para que o programa contemple emprego e renda, e como fazê-las.

No encontro, o economista e diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) Fausto Augusto Jr pediu atenção aos dirigentes para a política de desoneração da folha de pagamento de determinados setores, ainda em disputa em Brasília.

O economista explica que a Medida Provisória custa ao governo entre 18 e 20 bilhões de reais por ano, e não apresenta consistência como política de geração de emprego.

“É preciso ter cuidado para não cair na pauta do empresariado. Este governo é um governo de coalizão, com minoria no congresso. A nossa disputa é uma disputa de classe. A pauta do emprego e da renda não é das empresas, e não é porque não é sincera. Ela é nossa. Por isso, temos que ter claro qual política defendemos para o país, do contrário os trabalhadores serão engolidos pelos industriais”, afirmou.

O economista afirmou que para melhorar a renda do trabalhador – estagnada há dez anos – é preciso cuidar do déficit da balança de pagamento, uma conta entre o dinheiro que o Brasil recebe do exterior e o dinheiro que remete ao exterior. O saldo negativo desta conta gira em torno de 60 bilhões de dólares.

Para equilibrar esses pagamentos o país precisa de investimento internacional e financeiro, e para melhor a renda dos trabalhadores é preciso uma indústria forte, defenderam os debatedores.

“Muita coisa é produzida fora do Brasil, então ainda que mais pessoas tenham emprego e acesso a bens duráveis, continuaremos a remeter dinheiro para fora do país. Com isso sobe o dólar, sobe o preço dos alimentos, sobe a taxa de juros, cai a renda e cai o emprego”, explicou Fausto.

O secretário-geral da CUT, Renato Zulato, afirmou que a política industrial passa pela a estrutura dos sindicatos, mas que no entanto a discussão sindical não deve se limitar. “Não podemos pensar apenas no nosso quadrado, mas em quem está do lado, a política industrial, como é desenhada hoje, nos limita nesse sentido”, disse o dirigente.

Nova Indústria Brasil 

Com o objetivo de impulsionar a indústria nacional até 2033, o programa Nova Indústria Brasil, lançado na segunda-feira (22) pelo governo, usa instrumentos tradicionais de políticas públicas, como subsídios, empréstimos com juros reduzidos e ampliação de investimentos federais.

O programa também usa incentivos tributários e fundos especiais para estimular alguns setores da economia.

A nova política tem seis missões relacionadas à ampliação da autonomia, à transição ecológica e à modernização do parque industrial brasileiro. Entre os setores que receberão atenção, estão a agroindústria, a saúde, a infraestrutura urbana, a tecnologia da informação, a bioeconomia e a defesa.

A maior parte dos recursos, R$ 300 bilhões, virá de financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii).

Os financiamentos do BNDES relacionados à inovação e digitalização serão corrigidos pela Taxa Referencial (TR), que é mais baixa que a Taxa de Longo Prazo (TLP).

Principais medidas anunciadas 

  1. Cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais:

–    aumentar para 50% participação da agroindústria no PIB agropecuário;

–    alcançar 70% de mecanização na agricultura familiar;

–    fornecer pelo menos 95% de máquinas e equipamentos nacionais para agricultura familiar.

  1. Forte complexo econômico e industrial da saúde:

–    atingir 70% das necessidades nacionais na produção de medicamentos, vacinas, equipamentos e dispositivos médicos, materiais e outros insumos e tecnologias em saúde.

  1. Infraestrutura, saneamento, moradia e mobilidade sustentáveis:

–    diminuir em 20% o tempo de deslocamento de casa para trabalho;

–    aumentar em 25 pontos percentuais adensamento produtivo (diminuição da dependência de produtos importados) na cadeia de transporte público sustentável.

  1. Transformação digital da indústria:

–    digitalizar 90% das indústrias brasileiras;

–    triplicar participação da produção nacional no segmento de novas tecnologias.

  1. Bioeconomia, descarbonização, e transição e segurança energéticas:

–    cortar em 30% emissão de gás carbônico por valor adicionado do Produto Interno Bruto (PIB) da indústria;

–    elevar em 50% participação dos biocombustíveis na matriz energética de transportes;

–    aumentar uso tecnológico e sustentável da biodiversidade pela indústria em 1% ao ano

  1. Tecnologias de interesse para a soberania e a defesa nacionais:

–    autonomia de 50% da produção de tecnologias críticas para a defesa.

Recursos para financiamentos:

R$ 300 bi até 2026

–    Crédito: R$ 271 bi
–    Não reembolsáveis: R$ 21 bi
–    Equity (investimentos na bolsa de valores): R$ 8 bi

Fonte dos recursos: BNDES, Finep e Embrapii
Desse total, R$ 77,5 bi (28%) aprovados em 2023

Eixos

Indústria Mais Produtiva (R$ 182 bi)

–    Expansão da capacidade e modernização do parque industrial brasileiro;

–    Novo Brasil + Produtivo: financiamentos com Taxa TR (juros reduzidos) para digitalização e financiamentos não reembolsáveis para até 90 mil micro e pequenas empresas;

–    R$ 4 bi do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) com Taxa TR para expansão da banda larga e conectividade.

Indústria Mais Inovadora e Digital (R$ 66 bi)

–    Financiamentos do Programa Mais Inovação: Taxa TR para apoio à inovação e digitalização pelo BNDES e pela Finep;

–    Financiamentos não reembolsáveis definidos pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI);

–    Criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT);

–    Ampliação do uso de instrumentos de Mercado de Capitais (recursos levantados no mercado financeiro) para as seis missões industriais.

Indústria Mais Exportadora (R$ 40 bi)

–    Criação do BNDES Exim Bank: versão do BNDES voltada para apoio à exportação;

–    Linhas de financiamento do BNDES para pré e pós-embarque de bens e aeronaves;

–    Redução do spread (diferença entre os juros cobrados do tomador e as taxas de captação dos bancos) nas linhas de preembarque.

Indústria Mais Verde (R$ 12 bi)

–    Novo Fundo Clima: projetos de descarbonização da indústria com juros a partir de 6,15% a.a;

–    Instrumentos de Mercado de Capitais voltados para transição energética, descarbonização e bioeconomia;

–    Fundo de Minerais Críticos: fundo para alavancar recursos para a pesquisa e a extração de minerais usados em baterias de energia limpa.

Outras medidas

–    R$ 20 bi para a compra de máquinas nacionais para a agricultura familiar;
–    R$ 19,3 bi do Programa Mover, para estimular tecnologias menos poluentes na indústria automotiva e desenvolver novas formas de mobilidade e logística
–    R$ 3,4 bi do Programa de Depreciação Acelerada para a modernização de máquinas e equipamentos;
–    R$ 2,1 bi em isenção tributária para estimular produção de semicondutores e painéis fotovoltaicos;
–    R$ 1,5 bi em incentivos tributários à indústria química;
–    Antecipação do calendário de aumento de mistura do biodiesel ao diesel: 12% em abril de 2023, 14% em março de 2024 e 15% a partir de 2025;
–    Reservas para compras governamentais: indústrias nacionais terão vantagem em licitações;
–    Exigência de conteúdo nacional: percentuais mínimos de compra de produtos nacionais em obras do PAC, definidos por uma comissão do governo.

Instrumentos

  1. empréstimos;
  2. subvenções;
  3. investimento público;
  4. créditos tributários;
  5. comércio exterior;
  6. transferência de tecnologia;
  7. propriedade intelectual;
  8. infraestrutura da qualidade;
  9. participação acionária;
  10. regulação;
  11. encomendas tecnológicas;
  12. compras governamentais;
  13. requisitos de conteúdo local.

Foto: À esquerda Aroaldo Oliveira, da IndustriALL-Brasil, e à direita Fausto Augusto Jr, do Dieese

Créditos: Roberto Parizotti

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