Central completa 40 anos formando dirigentes e criando caminhos para a organização da classe trabalhadora
Escrito por: Rosely Rocha, Redação CUT
A luta pelos direitos começa pelo entendimento do que é o movimento sindical e de como fazer chegar aos trabalhadores e trabalhadoras as estratégias e formas de articulação, negociação e luta, junto a empresas e governos por melhores condições de trabalho e de vida. É preciso saber liderar e ter o conhecimento de que a política ligada à economia do Brasil e do mundo impactam diretamente na vida das pessoas para o bem e para o mal e, que por isso sem formação, organização e mobilização, a luta da classe trabalhadora será em vão.
É esta construção de conhecimento que a Central Única dos Trabalhadores (CUT) faz por meio da sua Secretaria de Formação, promovendo cursos, palestras e debates para que seus dirigentes aperfeiçoem sua atuação sindical na defesa dos direitos e interesses da classe trabalhadora.
A Secretaria Nacional de Formação executa a Política Nacional de Formação, que é deliberada a partir dos espaços de decisão das plenárias e dos congressos da CUT. Este ano no 14º CONCUT, que será realizado em outubro, serão deliberadas novas resoluções em relação aos eixos estabelecidos pela Central, e a formação é estratégica nesta organização.
A secretária de Formação da CUT Nacional, Rosane Bertotti destaca que o papel da formação foi fundamental para a criação da CUT.
“Talvez muitos não saibam, mas para a CUT chegar aos seus 40 anos, antes foi feito um processo formativo para a realização do congresso de 1983 [Conclat], que culminou com a criação da nossa Central”, conta.
Ela relembra a ousadia, na época, de se criar uma central para começar a mudar o movimento sindical durante o regime da ditadura. “Tivemos dirigentes presos, outros tombaram e quando a gente olha para a história de luta do Brasil, da democracia, a gente percebe os sinais, a importância da participação da CUT porque essa Central já nasceu defendendo os interesses imediatos e históricos dos trabalhadores e das trabalhadoras”.
De acordo com a dirigente, a formação é sempre uma política de base que contribui muito para a estrutura do movimento sindical.
“Eu diria que o movimento sindical que não tenha uma estratégia e uma política formativa ligada à sua ação para seus quadros se perde no tempo e acaba sendo um processo muito mecânico, e não de espaço político que articula a luta em prol da vida das pessoas. A formação é sempre uma política estruturante, como se fosse uma espinha dorsal de um processo organizativo”, declara.
A política na Formação
A CUT sempre teve uma posição política e ideológica bem definida, pautando seu processo formativo a partir da luta de classes, seja no processo de fundação da Central, seja no período democrático nos mandatos do presidente Lula e da presidenta Dilma, seja nesse período mais difícil que vivenciamos com o golpe de 2016, recorda Rosane Bertotti.
“A eleição de Bolsonaro mostra como a formação é um espaço de resistência e luta, de como a organização da CUT é forte”.
Rosane entende que o papel da formação é o de contribuir na ação e na estratégia de “reencantar” e trazer as pessoas para a luta sindical.
“A formação tem o papel de fazer o debate para a reflexão; é também um espaço para a crítica, a avaliação e a elaboração. É avaliação e elaboração, a formação é sempre um vai e vem”, diz.
Segundo Rosane, este é um processo permanente que não pode ser “ah vão fazer uma formação agora e daqui dois anos fazer de novo; não!. Somos teoria e prática, prática e teoria, o tempo todo. A formação tem, necessariamente, um processo permanente articulado com as políticas da Central”.
A cada mandato é elaborado o Plano Nacional de Formação (PNF-CUT). Ele é responsável por formular, gerir e realizar os programas de formação sindical de toda a Rede de Formação da CUT. O PNF-CUT é sempre construído a partir da estratégia política e organizativa da CUT definida nas resoluções dos Congressos Nacionais e dos Fóruns deliberativos da Central, como as Plenárias Estatutárias.
Somada aos programas, temos a Rede Nacional de Formação da CUT. A Rede é constituída de Secretarias de Formação de sindicatos e Ramos, das Estaduais da CUT, das Escolas Sindicais (seis ao todo em diferentes estados) dos Coletivos temáticos e de fóruns de deliberações (Conafor, Enafor e Conferência Nacional de Formação). O Plano não é um referencial pronto e acabado, ele é dinâmico.
A Formação na prática
A teoria de como se organizar nos cursos da formação foi colocada em prática pela professora de educação básica de São João do Rio do Peixe, cidade de 18 mil habitantes que fica a 480 km da capital do estado da Paraíba, Patrícia Macário. Ela que atua há oito anos no movimento sindical é também secretária de Formação da CUT-PB e já fez diversos cursos.
“Os cursos me deram uma base sólida para atuar no movimento sindical, mas o que mais gostei foi o de negociação coletiva. Esse curso me preparou para representar os trabalhadores em negociações. Fui mais preparada com técnicas e práticas de como me comportar em uma mesa de negociação”, diz Patrícia.
A dirigente cita como exemplo de sucesso em sua atuação, após o curso de formação, a reivindicação para o pagamento do piso nacional da enfermagem em sua cidade.
“O governo federal já repassou a verba para o município pagar o piso, mas na hora de reivindicar o valor, a prefeitura errou ao informar o custo baseado apenas no salário fixo, sem considerar as variáveis como carga horária de 36 horas, entre outras. Isso fez com que a prefeitura recebesse menos do que deveria e fomos nós que alertamos, e agora o Executivo Municipal está fazendo a correção para que os enfermeiros possam receber o que é de direito da categoria”, conta Patrícia.
Ela também diz que até mesmo sindicatos que não são da sua base a procuram porque veem que a CUT tem bons negociadores e pedem ajuda.
“Os cursos da formação nos ajudam e incentivam os trabalhadores a ter essa percepção e compreensão da negociação e de como lutar por nossos direitos”, conclui Patrícia.
Parcerias internacionais
A CUT é reconhecida mundialmente por toda a sua trajetória de lutas e também pela qualidade do seu processo formativo e por isso se articula com diversas entidades sindicais do mundo. Hoje existe a parceria CUT e DGB (central sindical da Alemanha) no projeto “Educação sindical e organização de jovens trabalhadores no Brasil”.
“Quando a gente vai conhecer uma central sindical no mundo, percebemos o quanto essas demais centrais têm seus institutos, suas escolas nacionais, seus processos formativos e elas também “bebem” da nossa experiência como, por exemplo, o nosso Programa de Formação de Formadores [FF], que foi irradiado para várias centrais do mundo”, diz Rosane Bertotti.
“Essa relação é de mão dupla. Ao mesmo tempo em que eles nos apoiam e nos financiam também bebem da nossa experiência, da nossa proposta pedagógica, que é uma proposta freiriana, de Paulo Freire, que tem a ver com concepção, estrutura e a prática sindical. Mas isso só é possível por causa da grandeza que a gente tem; grandeza que a CUT tem, e não pela formação que é um resultado dessa ação”, acrescenta a secretária de Formação da CUT Nacional.
Segundo ela, é importante reconhecer que a política de formação é resultado de uma parte da CUT e da articulação a partir da Secretaria de Relações Internacionais da Central.
Desafios para o futuro
O mundo do trabalho foi se transformando ao longo do tempo nas formas e nas novas profissões. Segundo Rosane, o capital sempre teve uma capacidade muito grande de se reinventar e ao mesmo tempo continuar se apropriando e fazendo a expropriação do trabalho.
“Hoje nós vivemos novas formas de pensar o mundo do trabalho e a CUT está atenta em como representar, como avançar, dialogar essa pauta e de como trazer esses trabalhadores para organização sindical”, diz.
Para ela a formação precisa estar atenta à essa a conjuntura e como fazer o enfrentamento e o combate do ódio que se estabeleceu no Brasil com a discriminação de trabalhadores da comunidade LGBTQIA+, a violência contra as mulheres e os ataques aos negros e negras.
“A formação tem que estar ligada, incluída nesta realidade que a gente está vivendo e, principalmente, que tenha um processo de trazer os trabalhadores ao movimento sindical, e a partir disso consiga avançar na luta dos trabalhadores e das trabalhadoras”, conclui.
Imagem: NALU VACCARIN / MGIORA